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BDI Nº.26 / 2005 - Assuntos Cartorários Voltar

ALGUMAS FACETAS DO CONDOMÍNIO EDILÍCIO E DA INCORPORAÇÃO NA ATIVIDADE NOTARIAL E NO REGISTRO DE IMÓVEIS – PARTE II (FINAL)

Substituto do 1º Serviço Notarial e Registral de Cabo Frio, RJ, especializando em Direito Registral Imobiliário pela PUC Minas D – um proprietário (ou promissário, ou cessionário) de um terreno resolve incorporar a construção de um empreendimento com diversas unidades autônomas para venda antes ou durante a construção, obedecendo-se aos termos do art. 32 da Lei 4.591/64. Nesse caso, o memorial de incorporação, devidamente registrado, produz, dentre outros efeitos, a instituição do condomínio, pois implica, necessariamente, na individualização das unidades para venda a terceiros, e a individualização das unidades nada mais é do que instituição de condomínio. Vejamos: O art. 1.332 do Código Civil diz: “Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar daquele ato, além do disposto em lei especial: I – a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremada uma das outras e das partes comuns: II – a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns; III – o fim a que as unidades se destinam”. O art. 32 da Lei 4.591/64 diz: “O incorporador somente poderá negociar sobre unidades autônomas após ter arquivado, no cartório competente de Registro de Imóveis, os seguintes documentos: [...] d) projeto de construção devidamente aprovado pelas autoridades competentes; e) cálculo das áreas das edificações, discriminando, além da global, a das partes comuns, e indicando, para cada tipo de unidade, a respectiva metragem de área construída; [...] i) discriminação das frações ideais de terreno, com as unidades autônomas que a elas corresponderão; [...]”. Do cotejo dos artigos acima, fica claro que a incorporação imobiliária atende às exigências legais impostas à instituição do condomínio, tanto que o caput do art. 32 da Lei 4.591, bem como a letra “i” do referido artigo, ao falar das unidades integrantes da incorporação as menciona como unidades autônomas, o que implica a discriminação e a individualização das unidades, caracterizando-se um condomínio edilício. Porém, há quem entenda que o registro do Memorial de Incorporação não supre a instituição do condomínio, nos termos dos arts. 7º e 8º da Lei nº 4.591/64. Nesse sentido é o Parecer do Exmo. Dr. CLÁUDIO LUIZ BUENO DE GODOY, Juiz Auxiliar da Corregedoria do Estado de São Paulo, de 12 de agosto de 1994, no Processo CG 1.403/94 - Campinas - Interessada: Construtora Samuel Rubinsky Neto Ltda. x 1º Oficial do 1º Cartório de Registro de Imóveis da Comarca. Segundo o eminente magistrado, “o registro da incorporação serve antes de tudo a viabilizar o início da negociação das unidades autônomas a serem erigidas, com garantia e segurança dos adquirentes”, e que, “evidentemente, tal registro em nada se relaciona com o nascimento jurídico destas unidades do condomínio, ainda não instituído”, posto que, “na linguagem de CAIO MÁRIO, ‘o contrato de incorporação extingue-se com a conclusão da edificação ou do conjunto de edificações e sua entrega aos adquirentes em condição de habitabilidade, considerada esta expressão no sentido de sua utilização” (“Incorporação Imobiliária”, Revista do IRIB, vol. 4/17)”, acrescentando, “por fim, também acerca da indispensabilidade do registro de que aqui se cuida, que o previu o art. 167, I, 17, da Lei 6.015/73, realce-se, para as hipóteses de incorporação e igualmente para os casos de edificações sem incorporação, desde que se trate de condomínio horizontal, como bem ressalvado por Valmir Pontes, in Registro de Imóveis, Saraiva, 1982, p. 24”, e mais, ainda, que, “segundo disposição expressa do art. 44 da Lei 4.591/64, “após a concessão do ‘habite-se’ pela autoridade administrativa, o incorporador deverá requerer a averbação da construção das edificações, para efeito de individua-lização e discriminação das unidades, respondendo perante os adquirentes pelas perdas e danos que resultem da demora no cumprimento desta obrigação. Ou seja. A averbação da construção, de que trata o art. 44 da Lei 4.591/64, além de seu objetivo comum de levar ao Registro edificação que se faça sobre terreno, no caso serve ainda a individualizar e discriminar as unidades autônomas do prédio”. Em apoio do seu entendimento, invoca, ainda, o insigne magistrado, a título de exemplo, “o ac. 1.846-0, quando assenta que “no condomínio em edifícios, enquanto inocorrerem o registro da especificação, que representa ‘um autêntico procedimento divisório entre os comunheiros’ (cf. J. NASCIMENTO FRANCO e N. GONDO, Condomínio em Edifícios, RT, 2ª ed., 1978, p. 51) e a averbação da construção do prédio, para efeito da jurídica individualização e discriminação das unidades autônomas, não há que se cogitar da realidade física dos apartamentos, que, destarte, como unidades geodésicas futuras, dependentes de providências ulteriores, não podem ser objeto de negócios e nem assim matriculados” (g.n.)”, bem como que “de idêntico jaez há decisão segundo a qual “os instrumentos apresentados, na medida em que transpiram negócios jurídicos sobre os próprios apartamentos, têm seu registro condicionado ao registro prévio da instituição, especificação e convenção do condomínio e averbação da construção (art. 167, I, 17 e 18, e II, 4, da Lei de Registros Públicos)” (ap. 286.693, g.n.)”. No mesmo sentido, CHALHUB, debaixo da rubrica “1.3. A dinâmica da incorporação”, ao ‘identificar alguns aspectos básicos da estruturação e do desenvolvimento da incorporação’6 termina por dizer que “uma vez concluída e averbada a construção no Registro de Imóveis, com a conseqüente individualização das unidades autônomas, deverá ser instituído o condomínio especial, cujas características encontram-se estabelecidas nos arts. 1º ao 4º da Lei nº 4.591/64”.7 Data maxima venia, uma análise mais abrangente dos efeitos da incorporação imobiliária, nos termos do art. 32 da Lei nº 4.591/64, demonstra ser desnecessária a exigência de ato autônomo de instituição do condomínio, e seu conseqüente registro, depois de já se ter registrado o memorial de incorporação, ainda que tal exigência resulte em vantagem financeira para quem quer que seja. É bem verdade que a incorporação imobiliária, em sentido estrito, vigora tão-somente até a conclusão das obras, encerrando-se algumas obrigações do incorporador com a averbação do “habite-se” no Registro de Imóveis, como a de custear “a construção das unidades que não tenham tido a responsabilidade pela sua construção assumida por terceiros e até que o tenham” (art. 35, § 6º, Lei 4591/64). Mas não se pode negar que, desde o seu registro no Ofício Imobiliário, a incorporação produz efeitos que ultrapassam as obrigações do incorporador durante a construção, pois, como bem esclarece CHALHUB8, “é o registro [DA INCORPORAÇÃO] que legitima o incorporador a empreender sua atividade empresarial de oferta pública das frações ideais do terreno e das acessões que corresponderão às futuras unidades imobiliárias”. (Entre colchetes, acrescentado). Evidentemente, tal “atividade empresarial” – e não estamos aqui tomando o termo com a acepção do Código Civil -, não cessa com a averbação da construção do empreendimento, pois, além da obrigação de construir as unidades, o incorporador tem outras responsabilidades decorrentes da incorporação, envolvendo aspectos fiscais relativos aos valores recebidos em razão dos negócios de compra e venda das unidades, antes e após as obras; a obrigação de outorgar os contratos definitivos em cumprimento das promessas de venda; o direito de rescindir qualquer daqueles contratos e de revender a unidade retomada, dentre outras. Especificamente em relação às vendas das unidades autônomas, às quais correspondem frações ideais do terreno e demais áreas comuns, cabe ressaltar que tais vendas não seriam possíveis se a incorporação não tivesse o condão de instituir o condomínio em construção, individualizando e especificando as unidades objeto dos contratos de promessa de compra e venda e/ou de compra e venda, pois até que a instituição do condomínio seja feita nenhuma unidade poderá ser vendida isoladamente exatamente pela ausência de sua individualidade. Na realidade, se a incorporação imobiliária não produzisse a instituição do condomínio, não se poderia falar em promessa de compra e venda ou em compra e venda de fração ideal do terreno e da respectiva unidade autônoma, devidamente identificada e localizada dentro do empreendimento, sejam casas térreas ou assobradas sejam unidades em edifícios de dois ou mais pavimentos. Não se teriam promissários ou compradores de unidades autônomas, mas meros adquirentes de uma fração ideal indistinta, constituindo-se, na realidade, o condomínio voluntário do Código Civil (arts. 1.314 a 1.322), e estariam os condôminos sujeitos àquelas regras, como o direito à preempção do art. 1.322. De fato, a incorporação imobiliária descaracteriza o condomínio voluntário. O que se tem é um condomínio edilício, com unidades autônomas, o que significa dizer: independentes entre si; e demonstra que o registro da incorporação tem como efeito a instituição do condomínio. Basta pensar na hipótese do incorporador vender todas as unidades à vista no lançamento do empreendimento. Que tipo de escritura será feita aos adquirentes? Considerando-se que o incorporador seja o proprietário do terreno, e não um promissário, por exemplo, serão feitas ESCRITURAS DE COMPRA E VENDA DAS FRAÇÕES •••

Valestan Milhomem da Costa