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BDI Nº.34 / 2008 - Assuntos Cartorários Voltar

ASPECTOS PRÁTICOS DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEIS – FINAL

3. Atos do negócio de alienação fiduciária de bem imóvel O negócio de alienação fiduciária comporta atos diretos e indiretos. Os atos diretos podem ser divididos em principais e derivados. Os atos diretos principais são a constituição e a extinção da propriedade fiduciária mediante um registro e uma averbação, respectivamente, no Registro de Imóveis (artigos 23 e 25, Lei 9.514/97, c/c art. 167, I, 35, e art. 248, Lei 6.015/73). Dessa sorte, em todo negócio de alienação fiduciária haverá, necessariamente, ao menos um registro e uma averbação, no Registro de Imóveis. Esses atos dizem respeito à constituição e execução regular do negócio de alienação fiduciária de imóvel. Os atos diretos derivados são: (i) a intimação do fiduciante para purgar a mora; (ii) a purgação da mora ou, a não purgação da mora; (iii) a consolidação da propriedade; (iv) a resolução da propriedade em favor do fiduciante, na fase do leilão; (v) a arrematação em leilão; (vi) o cancelamento da dívida e (vii) a extinção da dívida, não havendo arrematação do bem em leilão. Os atos indiretos são a transmissão dos direitos do fiduciante sobre o imóvel, por título singular ou universal, na hipótese do fiduciante ser pessoa física, e os atos de transmissão do crédito do fiduciário, por título singular ou universal, na hipótese também deste ser pessoa física. A transmissão dos direitos do fiduciante sobre o imóvel deve ocorrer por contrato de natureza definitiva, como a compra e venda, a permuta, a doação, a dação, a cisão, a incorporação e a fusão (estes últimos na hipótese do fiduciante ser pessoa jurídica), e não por contrato de cessão de direitos. Não obstante a cessão de direitos tenha o sentido lato de transmissão de um crédito ou de direitos, em sentido estrito ela não figura em nosso sistema jurídico como contrato para transmissão definitiva de direitos reais sobre imóveis, mas apenas em caráter preliminar, como a cessão dos direitos aquisitivos de imóvel, exigindo, sempre, a outorga do título definitivo respectivo. Contudo, havendo a transmissão dos direitos do fiduciante a um terceiro por contrato de cessão de direitos, e promovendo o terceiro o pagamento da dívida junto ao fiduciário, este somente poderá conferir àquele a quitação da dívida para averbação e resolução da propriedade fiduciária (direito real de garantia), mas não poderá conferir-lhe título definitivo de propriedade, uma vez que, sem a consolidação, não é proprietário. Tampouco poderá o antigo fiduciante conferir esse título, uma vez que já transmitiu seus direitos. Este fato terá como resultado a aquisição da propriedade imobiliária definitiva por um título inusitado em nosso direito; ou seja, por cessão de direitos, e haverá, por conseqüência, a quebra regular na cadeia suces-sória dos títulos definitivos, fazendo surgir no sistema jurídico brasileiro hipótese em que alguém, havendo adquirido por cessão de direitos, contrato de natureza preliminar, transmitirá este seu direito (após a extinção da propriedade fiduciária) por compra e venda ou outro contrato definitivo. Todo esse imbróglio jurídico é produto da equivocada conclusão de que o fiduciante não é proprietário do bem, ou que sobre o bem tem mero direito expectativo, tal como uma propriedade suspensiva, muito embora não haja regra jurídica que determine que o direito suspensivo, ainda que fosse o caso, tenha que ser transmitido por cessão de direitos. Ora, o título haverá de ser, em todo caso, definitivo, sem prejuízo da condição suspensiva, sobretudo na alienação fiduciária, que se faz necessária anuência do fiduciário. Para desclassificar o contrato de cessão de direitos para transmissão dos direitos do fiduciante, basta que pensemos o fiduciante como pessoa jurídica e que ocorra uma cisão (divisão em outras), incorporação (por outra) ou fusão (formação de outra). Em qualquer desses casos a transmissão será por contrato de natureza definitiva, equivalente a uma compra e venda, dação ou permuta, embora em decorrência de um negócio próprio do Direito Empresarial, e operará a transmissão dos direitos reais do fiduciante sobre o imóvel, não sendo possível pensar em mera cessão de direitos em sentido estrito, pois a transmissão é definitiva e decorre do próprio contrato de alteração social, inclusive por escritura pública. Havendo a transmissão dos direitos do fiduciante sobre o imóvel, o ato a ser praticado no Registro de Imóveis é o registro do contrato, por ser hipótese de transmissão de direitos reais de propriedade, exigindo-se, por conseqüência, a prova do recolhimento do imposto de transmissão e, se for o caso, do laudêmio. A transmissão do crédito do fiduciário, por outro lado, sempre ocorrerá por cessão em sentido estrito, ainda que essa transmissão decorra de título universal (exemplo: formal de partilha ou carta de adjudicação, na hipótese de sucessão do fiduciário pessoa física) ou por algum contrato do Direito Empresarial (fiduciário pessoa jurídica), pois a cessão é o contrato típico para transmissão das obrigações, conforme estabelecem os artigos 286 a 298 do Código Civil. Em todo caso de transmissão do crédito do fiduciário, o ato a ser praticado no Registro de Imóveis é de averbação, não se exigindo, em nenhuma hipótese, o recolhimento do imposto de transmissão ou do laudêmio, por não ser hipótese de transmissão de direitos reais de propriedade. Essa exigência somente se verificará se a transmissão for da propriedade do imóvel, na fase do leilão, após a consolidação da propriedade resolúvel. 4. Efeito da constituição da propriedade fiduciária A constituição da propriedade fiduciária, direito real de garantia (art. 17, IV e § 1º), tem como efeito imediato o desdobramento da posse do imóvel em direta e indireta, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto, nos termos do art. 23 da Lei nº 9.514/97. 5. Desdobramentos do negócio de alienação fiduciária de imóvel, e respectivos atos no registro de imóveis Se não ocorrer a execução regular do contrato de financiamento, mediante o pagamento pontual das prestações, o negócio de alienação fiduciária de imóvel poderá ter vários desdobramentos, o qual terá início com a intimação do devedor (fiduciante) para purgar a mora. 5.1. Efeitos e requisitos da intimação do fiduciante (art. 26) A intimação do fiduciante tem por efeito imediato a sua constituição em mora, a partir da qual deverá efetuar o pagamento do valor cobrado, sob pena de desencadear a consolidação da propriedade e a execução imediata do contrato. O pagamento do valor cobrado na intimação corresponde à purgação da mora e tem por efeito a convalidação do contrato, o que significa o restabelecimento das condições regulares de execução das obrigações contratadas. O procedimento de intimação do fiduciante, porém, deve obedecer ao rito minudenciado no art. 26 da Lei nº 9.514/97, tendo início com o requerimento do fiduciário dirigido ao oficial do registro de imóveis para intimar o fiduciante, devendo conter (ou vir acompanhado das) as informações constantes, na sua maioria, no parágrafo § 1º, a saber: a) o valor das prestações vencidas, acrescido dos juros convencionais, e o das que vencerem até a data do pagamento; b) a data das prestações vencidas e não pagas; c) a declaração de haver escoado o prazo de carência ajustado para intimação (§ 2º); d) o valor das penalidades e demais encargos contratuais; e) o valor dos encargos legais, inclusive tributos; f) o valor das contribuições condominiais, se devidas; g) o valor das despesas de cobrança e intimação; h) o prazo de 15 dias para purgação da mora. Todo o procedimento de intimação do fiduciante, desde o requerimento para intimação, a eventual circunstância da intimação por edital, a purgação ou a não purgação da mora e o encerramento do procedimento de intimação deverão ser lançados no protocolo, para fixação dos prazos legais envolvidos no procedimento, que devem ser observados, sob pena de comprometer eventual consolidação e execução do contrato, por inobservância de formalidade legal. 5.2. Meios de intimação do fiduciante Estabelece o § 3º do art. 26 da Lei nº 9.514/97, que a intimação deverá ser feita pessoalmente ao devedor, seu representante legal ou procurador regularmente constituído (§ 3º) da seguinte forma: a) pelo oficial do próprio Registro de Imóveis; b) por oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva receber a intimação, a critério do oficial do Registro de Imóveis; c) pelo correio, com AR, a critério do oficial do Registro de Imóveis. A exigência da intimação pessoal dá-se em razão da natureza da mora do devedor, que, nesse caso, é ex persona, ou seja, exige o recebimento pessoal do devedor para que se caracterize, diferente da mora ex re, que decorre do simples atraso no pagamento, conforme estabelecido na lei. Disso resulta que o oficial do registro de imóveis deverá, através dos meios que a lei lhe confere, diligenciar, no pleno sentido da palavra, todo esforço •••

Valestan Milhomem da Costa (*)