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BDI Nº.5 / 2009 - Assuntos Cartorários Voltar

ATA NOTARIAL – PARTE II

1.4. CLASSIFICAÇÃO DOS ATOS NOTARIAIS – INSTRUMENTOS PÚBLICOS NOTARIAIS Os atos notariais ou atos do ofício de tabelião, segundo o linguajar tradicional brasileiro, se materializam mediante instrumentos públicos notariais. E, numa visão esquemática, podem ser eles classificados assim: 1.4.1. ATOS NOTARIAIS PRINCIPAIS – INSTRUMENTOS PÚBLICOS NOTARIAIS PRINCIPAIS: – escritura pública, incluindo a de testamento e a de procuração; – ata notarial, incluindo o auto de aprovação de testamento cerrado (arts. 1.868 e 1.869 CCiv/2002, correspondente ao art. 1.638, IV a XI, CCiv/1916) e a consequente anotação sucinta dessa ocorrência em livro de notas (art. 1.874 CCiv/2002, correspondente ao art. 1.643 CCiv/1916). 1.4.2. ATOS NOTARIAIS DERIVADOS – INSTRUMENTOS PÚBLICOS NOTARIAIS DERIVADOS, que reúnem a autenticação de documento avulso mediante: – reconhecimento de firma; – pública-forma (atualmente conhecida como autenticação de cópia). 1.4.3. ATOS ou INSTRUMENTOS PÚBLICOS NOTARIAIS COMPLEMENTARES: – traslado; – certidão. Essa classificação se coaduna com o disposto na primeira parte do art. 144 do Regulamento Notarial Espanhol, a saber: \"Artículo 144. El instrumento público com-prende las escrituras públicas, las actas, y, en general, todo documento que autorice o Notario, bien sea original, en copia o testimonio.” 2. ATA NOTARIAL E SUA IMPORTÂNCIA – DIFERENCIAÇÃO DA ESCRITURA PÚBLICA Todos estes apontamentos até agora feitos servem de prolegômenos para discorrer sobre a ata notarial; e a classificação aqui apresentada tem em mira situá-la no conjunto dos instrumentos públicos notariais. Ressalva-se, entretanto, que, ao incluí-la entre os instrumentos chamados principais, não há a intenção de a nivelar em importância, no mundo jurídico, à escritura pública, mas simplesmente salientar-lhe os méritos enquanto ata, sem deixar de reconhecer a superioridade da escritura, à consideração de ser ela que qualifica o notariado de tipo latino, por sua multissecular excelência já sedimen-tada. Pode-se mesmo asseverar que o prestígio dele se acha indissoluvel-mente ligado à respeitabilidade dela e vice-versa. Aliás, em matéria de escritura pública, as suas diversas modalidades também não se apresentam em mesmo patamar de valoração hierárquica, pois a de testamento se sobressai das demais, quer pela repercussão post mortem quer pelo inerente rigorismo formal, enquanto a de procuração tem menor relevo, dado o seu caráter de acessoriedade. Pela escritura pública, em geral, são formalizados os negócios jurídicos, inclusive os de declaração unilateral de vontade. Ou, noutras palavras, assim refere a segunda parte do art. 144 do Regulamento Notarial Espanhol: “Artículo 144. [....]. Contenido próprio de las escrituras públicas son las declaraciones de voluntad, los actos jurídicos que impliquen prestaciones de consentimiento y los contratos de todas clases.” Trata-se, pois, a escritura pública de documento que vale por si mesmo. Ao passo que a ata notarial, em regra, se restringe à narrativa que materializa a existência de um fato jurídico. Seu conteúdo, a terceira parte do art. 144 do Regulamento Notarial Espanhol o delimita nestes termos: “Artículo 144. [....]. La órbita propia de las actas notariales afecta exclusivamente a hechos jurídicos que por su índole peculiar no puedan calificarse de actos ou contratos a parte de otros casos en que la legislación notarial establece el acta como manifestación formal adecuada.” A ata notarial serve – é verdade – como qualificado meio de prova, mas suscetível de ser sopesado pelo magistrado, no conjunto probatório de ação judicial, se for o caso. Respeitada, entretanto, uma hierarquia valorativa que decorre da natureza das coisas, a ata se reveste de toda a seriedade ínsita aos atos notariais, de qualquer natureza que sejam, uma vez que o tabelião, ao narrar nela um fato jurídico a fim de perpetuar sua ocorrência, a redige, tal como faz com a escritura pública, de visu et auditu suis propriis sensibus, sob o pálio da personalizada e inconfundível fé pública notarial. Todavia, assim considerando, a sua noção alcança amplitude demasiada, pois, na realidade, todo instrumento público notarial é – ou deve ser – a materialização de algo em forma narrativa e adstrita ao que o tabelião presencia ou presenciou, vendo e ouvindo por seus próprios sentidos. Aliás, nesse contexto, poder-se-ia especular que a ata notarial seria o gênero do qual os demais instrumentos públicos notariais se tornariam espécies, até mesmo as simples autenticações de documentos avulsos, formalizadas mediante atas em sua mais radical simplificação. Talvez haja acontecido que, vindo a afirmar-se o notariado como uma instituição social, segundo a ordem natural das coisas, antes de ser reconhecido como instituição jurídica, a sua atividade se haja desenvolvido em vista das exigências e conveniências humanas. Então, o notário se tornara redator qualificado de documentos que, por sua influência no meio social, eram chamados genericamente de instrumentos públicos. Dentre eles, viera a sobressair, como espécie, a escritura pública. Assim, teria sido só depois do delineamento do seu alcance na órbita das relações jurídicas que a idéia de ata notarial e a sua difusão na prática, como distinta espécie de instrumento público, haveriam de corporificar por necessidade de atendimento à narrativa documental adstrita ao âmbito dos fatos. Primeiro, ela teria fincado raízes, sem a designação hoje assente, ao longo de quase um milênio da evolução do notariado, na trajetória que o fez transformar-se em relevante e especializada atividade jurídico-profissional. ARGENTINO I. NERI (1970, 3:1106) anotou, com base no Diccionario enciclópedico Salvat, que, no ano de 1581, se criou, na Espanha, o costume de fazer-se ata perante notário (escribano público), informação essa à qual aditou, citando MONLAU (Diccionario etimológico de la lengua castellana), que, àquela época, já era prática notarial, em fim de documento não caracterizado como escritura, apor a palavra actum (antecedente etimológico de acta), antes da indicação de lugar e data. A realidade mostra que, já na segunda metade do século XIX, a partir da Espanha, as atas notariais adquiriram feição própria, ao merecerem acolhida legislativa e disciplina regulamentar que lhes deram status como espécie de instrumento público. Antes, elas provinham de praxes, usos e costumes cuja utilidade e importância o tempo sedimentou, conforme demonstram os três exemplos de sua longevidade que seguem. O primeiro exemplo, espanhol, apresenta uma típica ata de notificação, referida por ENRIQUE GIMENEZ-ARNAU (1976:748), ao anotar que, quando, no início do século XVI, HERNÁN CORTÉS conquistava o México em nome da coroa castelhana, don DIEGO DE GODOY, Escribano del Rey que o acompanhava, teve a incumbência de, no exercício de seu mister notarial, lavrar a ata em que, a requerimento do conquistador, dava conhecimento da sua façanha aos índios mexicanos com a admoestação •••

João Teodoro da Silva (*)