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BDI Nº.11 / 2010 - Assuntos Cartorários Voltar

A SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA COMO INSTRUMENTO DE HARMONIZAÇÃO DOS CONFLITOS NO ÂMBITO DO SISTEMA REGISTRAL

CONSIDERAÇÕES INICIAIS Inicialmente, faz-se necessário definir o que venha a ser suscitação de dúvida, conhecer sua origem, descobrir quem são os legitimados a utilizá-la, delinear sua natureza jurídica, para somente depois adentrar nos fins colimados pelo instituto. 1. ORIGEM O professor Regnoberto M. de Melo Jr, em sua obra Lei de Registros Públicos Comentada (2003, p. 494), informa sobre a cronologia do Art. 198 da Lei nº 6.015/73, o qual trata sobre o instituto da suscitação de dúvida, a saber:  O artigo 198 da LRP nasceu do art. 66 do Decreto nº 370, de 1890. O instituto foi disposto no art. 824 do CC; no art. 207 do Decreto nº 18.542, de 1928; no art. 215 do Decreto nº 4.857, de 1939; no art. 201 do Decreto-Lei nº 1.000, de 1969. Na redação original da LRP, correspondia ao art. 198. A lei 6.216, de 1975, agregou os arts. 198 a 201 do texto original do vigente art. 198. O decreto legislativo nº 4.827, de 1924, nada dispôs. Ainda hoje, após ter sobrevivido à passagem por inúmeros diplomas normativos, o Art. 198, que alberga o instituto da dúvida, continua plenamente regulado na Lei nº 6015/73 (Lei dos registros públicos), com seu texto intacto, sem alterações. Segue o texto legal: Art. 198 - Havendo exigência a ser satisfeita, o oficial indicá-la-á por escrito. Não se conformando o apresentante com a exigência do oficial, ou não a podendo satisfazer, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competente para dirimí-la, [...] (grifo nosso). 2. CONCEITO O instituto possui supedâneo no inconformismo suportado pelo apresentante do título que considera a exigência realizada pelo oficial abusiva, eivada de erro ou má-fé. Hércules Aghiarian (2005, p.89) vislumbra qual deve ser a conduta do lesado: “[...] encontrando-se certo, o interessado, de que seu título reúne os requisitos do registro, ou ainda que a exigência na apresentação de outros registros e atos circunstantes é inexigível, poderá peitar o oficial, suscitando dúvida [...]”.   Na mesma linha, vale ressaltar a definição de dúvida consubstanciada pela doutrina majoritária, qual seja: “[...] o caminho legal de submeter à apreciação judicial as exigências formuladas pelos oficiais, nos títulos apresentados a registro, quando o interessado se recusa ou se julga impossibilitado de satisfazê-lo.” (BALBINO FILHO, 2006, p.38)   3. OS LEGITIMADOS A SUSCITAR E A DÚVIDA INVERSA O oficial de registro é a pessoa legitimada por Lei para suscitar a dúvida com fulcro nos translúcidos termos do Art. 198, da LRP, quando anota: “o oficial indicá-la-á por escrito”. Antes do advento da citada norma jurídica, não havia unanimidade na doutrina e jurisprudência quanto à possibilidade do interessado suscitar o instituto, contudo, com seu advento, a questão ficou pacífica, não sendo permitida a ocorrência da dúvida inversa. Neste sentido, assenta o entendimento de Walter Ceneviva (2003, p. 400): A jurisprudência hesitou, no passado, ora admitindo, ora recusando, a chamada dúvida inversa, declarada pela parte ao juiz, com a afirmativa de exigência descabida do serventuário [...] não pode, porém, substituir-se ao serventuário na própria declaração, como, aliás, resulta de outros textos legais que a ela se referem.   O Supremo Tribunal Federal adotou o entendimento acima quando no dia 17 de junho de 1983 julgou o recurso extraordinário nº 77.966 do Estado de Minas Gerais, no qual o ministro relator Aldir Passarinho leciona que “tendo sido a formulação da dúvida anterior à Lei n. 6.015/73, a jurisprudência era vacilante quanto a admiti-la ou não sob a forma da dúvida inversa, e que era aquela dirigida diretamente pela parte ao juiz, ao invés de o ser pelo oficial de registro.” Apesar da decisão da corte maior, o Desembargador Wilson Marques, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro no julgamento da apelação nº 13.260/98, publicada em primeiro de julho de 1999, decidiu no sentido da admissão da dúvida inversa. Em contra partida, o Desembargador Caetano Fonseca Costa, vinculado ao mesmo órgão jurisdicional acima, decidiu que a Lei nº 6015/73 não regulamentou o dúvida inversa, não sendo esta permitida. À luz do exposto, denota-se que a matéria continua controvertida, não se podendo concordar com o posicionamento do doutrinador Walter Ceneviva. Afinal, o direito não é estático, modifica-se com o surgimento de novos fatos na linha temporal. Devido a isto, não se pode considerar uma decisão de 1983 (mesmo sendo do STF), anterior à Constituição Federal, como pacífica na jurisprudência contemporânea.   Entende-se, portanto, que a legislação vigente admite somente o oficial de registro como legitimado para o instituto da dúvida, por expressa previsão legal (Art. 198 da lei nº 6015/73). Ademais, o interessado dispõe da via contenciosa para discussão do seu problema, como consequência •••

Maria Darlene Braga Araújo (*) e Ricardo Rios Gondim (**)