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BDI Nº.4 / 2011 - Jurisprudência Voltar

O locatário pode ser fiador quando houver mais de um locatário (fiança recíproca) ou se for sócio da pessoa jurídica locatária

Recurso Especial nº 911.993 - DF (2006/0279066-1) Relatora: Ministra Laurita Vaz Recorrente: Ancar Empreendimentos Comerciais S.A e outros Recorrido: Valter Eleutério da Silva Recorrido: Nelson Eleutério da Silva EMENTA Direito Civil. Locação comercial. Fiança recíproca. Mais de um locatário. Validade da garantia. 1. “A fiança é um contrato acessório que pressupõe, para sua existência, três pessoas: o credor, o devedor afiançado e o fiador” (AgRg no Ag 1.158.649/RJ, 5.ª Turma, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJe de 29/03/2010). 2. “Havendo mais de um locatário, é válida a fiança prestada por um deles em relação aos demais” (idem). Nesse caso, tem-se uma fiança recíproca, o que afasta a invalidade do contrato. 3. Afastado o impedimento à fiança prestada pelo próprio locatário e constatada a existência de penhora de outros bens dos devedores/fiadores, impõe-se o retorno dos autos ao juízo da execução para que examine a necessidade do restabelecimento da penhora do imóvel residencial do locatário fiador. 4. Recurso especial parcialmente provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar parcial provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi, Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP) e Felix Fischer votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília (DF), 02 de setembro de 2010 (Data do Julgamento) Ministra Laurita Vaz, Relatora RELATÓRIO A Exma. Sra. Ministra Laurita Vaz (Relator): Trata-se de recurso especial interposto por Ancar Empreendimentos Comerciais S.A e outros, com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, em sede de agravo de instrumento em execução, o qual restou ementado nos seguintes termos, litteris: \"DIREITO CIVIL. EXECUÇÃO. CONTRATO DE LOCAÇÃO. FIANÇA. LOCATÁRIO FIADOR. IMPOSSIBILIDADE. \'A fiança bancária, como toda fiança, pressupõe três pessoas distintas: o credor, o devedor afiançado e o banco fiador. Não é juridicamente possível que uma pessoa (...) seja simultaneamente devedora afiançada e fiadora\' (REsp 62.198⁄SP). Agravo de instrumento conhecido e não-provido. Unânime.\" (fl. 73) Alegam os Recorrentes, nas razões do especial, violação ao art. 1.481 c. c. art. 145 do Código Civil de 1916, sob o argumento de que \"[...] não existe nenhuma incompatibilidade entre o fato de alguém ser, de um lado, locatário de imóvel e, de outro, ser um dos fiadores dele próprio, como no caso presente, até porque, insista-se, não há nenhuma restrição de ordem legal\" (fl. 88). Houve contrarrazões (fls. 106⁄113). Admitido o recurso na origem, subiram os autos a esta Corte. É o relatório. VOTO A Exma. Sra. Ministra Laurita Vaz (Relator): Colhe-se dos autos que os ora Recorridos celebraram um contrato de locação comercial no qual figuraram como fiadores de si mesmos (fl. 76). O contrato foi executado judicialmente, o que resultou na penhora do único imóvel residencial de propriedade de um dos Recorridos. O juízo da execução, acolhendo manifestação dos Locatários Fiadores, revogou penhora por entender inválida a fiança de si mesmo (fl. 77). Em sede de agravo de instrumento, a decisão foi mantida pelo Tribunal a quo, o que ensejou a interposição do presente recurso especial. Pois bem. Conforme do art. 1.481 do Código Civil de 1916, à época vigente, \"dá-se o contrato de fiança, quando uma pessoa se obriga por outra, para com seu credor, a satisfazer a obrigação, caso o devedor não a cumpra\". E, na linha do mencionado comando normativo, este Superior Tribunal de Justiça firmou o posicionamento de que a fiança de si mesmo não é um contrato juridicamente possível, pois esta espécie de avença pressupõe a existência de três partes, pois sua lógica é a garantia de uma terceiro. A propósito: \"PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ARTIGO 105, INCISO III, \"A\" , DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. FIANÇA BANCÁRIA PRESTADA PELO BANCO DEVEDOR. INCABÍVEL. ARTIGOS 9º, II, DA LEI N. 6.830⁄80, 1.481 DO CÓDIGO CIVIL E 109 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. No âmbito do Direito Tributário, faculta-se ao executado oferecer fiança bancária em garantia da execução fiscal (art. 9º, II, da Lei n. 6.830⁄80). A fiança civil e a fiança bancária são institutos de mesma natureza. Com efeito, \"a fiança bancária não sofre quaisquer desvios ao regime geral, devendo, como aquela, ser expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal\" (cf. Matias, Armindo Saraiva, \"Garantias bancárias\", in Revista de Direito Mercantil, n. 107, Malheiros, São Paulo, julho-setembro⁄1997, p. 13). Dessarte, a natureza do instituto da fiança pressupõe que ela seja ofertada por terceiro, porquanto ela se destina a assegurar o cumprimento de obrigação de outrem. A fiança bancária, nesse sentido, pressupõe três pessoas distintas: o credor, o devedor afiançado, ou executado, e o banco fiador, ou garante. Incabível, portanto, a prestação de fiança bancária, para garantia do processo de execução fiscal, pelo próprio banco devedor, in casu, a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Recurso especial não conhecido.\" (REsp 183.648⁄SP, 2.ª Turma, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO, DJ de 01⁄07⁄2002.) \"CÍVEL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. FIANÇA BANCARIA. MESMA PESSOA FIGURANDO COMO DEVEDOR AFIANÇADO E FIADOR: IMPOSSIBILIDADE. RECURSO NÃO CONHECIDO. I - A FIANÇA BANCARIA, COMO TODA FIANÇA, PRESSUPÕE TRÊS PESSOAS DISTINTAS: O CREDOR, O DEVEDOR AFIANÇADO E O BANCO FIADOR. NÃO E JURIDICAMENTE POSSÍVEL QUE UMA PESSOA (IN CASU, A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL) SEJA SIMULTANEAMENTE DEVEDORA AFIANÇADA E FIADORA. II - INTELIGÊNCIA DO ART. 1.481 DO CC E DO ART. 9., II, DA LEI N. 6.830⁄1980. III - RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. (REsp 62198⁄SP, 2.ª Turma, Rel. Min. ADHEMAR MACIEL, DJ de 09⁄06⁄1997.) Remetendo a esse último precedente, Nelson Nery afirma: \"não é juridicamente possível que uma mesma pessoa seja, simultaneamente, devedora afiançada e fiadora\" (Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, Código Civil Comentado, 7.ª ed., p. 735) . Não obstante esse entendimento, esta egrégia Turma, em caso análogo ao dos presentes autos, se posicionou no sentido de que é válida a fiança prestada pelo próprio locatário quando há mais de um locatário. Havendo mais de um locatário, a hipótese configura, na verdade, uma fiança recíproca, uma vez que um locatário é considerado fiador dos outros e vice-versa, afastando a invalidade do contrato. Por oportuno, confira-se a ementa do mencionado julgado: \"DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. LOCAÇÃO. FIANÇA PRESTADA PELA PRIMEIRA LOCATÁRIA EM FAVOR DA SEGUNDA LOCATÁRIA. VALIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A fiança é um contrato acessório que pressupõe, para sua existência, três pessoas: o credor, o devedor afiançado e o fiador. 2. Havendo mais de um locatário, é válida a fiança prestada por um deles em relação aos demais. 3. Agravo regimental improvido.\" (AgRg no Ag 1.158.649⁄RJ, 5.ª Turma, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJe de 29⁄03⁄2010.) Colhe-se do voto condutor do referido acórdão a seguinte fundamentação: \"Destarte, embora se considere a solidariedade que une as locatárias, se a agravante optou por reforçar a segurança do negócio mediante o oferecimento da fiança, plenamente válida em relação à segunda locatária, porquanto se trata de terceira pessoa em relação à agravante, não há falar em nulidade de tal garantia.\" E essa é exatamente a situação dos presentes autos, em que os Recorridos Valter Eleutério da Silva e Nelson Eleutério da Silva figuram no contrato de locação de fls. 14 a 20 como locatários e também como fiadores. Nesses termos, entendo que é válida a fiança prestada pelos Locatários, ora Recorridos. Não obstante, deixo de restabelecer, desde já, a penhora realizada sobre o bem de família do Locatário Fiador. Ora, •••

(STJ)