Corretagem – Celebração de contrato de cessão e transferência de imóvel – Pagamento de sinal – Rescisão do contrato pelo comprador – Comissão devida
Recurso Especial nº 1.228.180 - RS (2011/0002135-3) Relator: Ministro Raul Araújo Recorrente: Roberto Branchelli Júnior Recorrido: Ângela Las Casas Duarte EMENTA Processual Civil. Civil. Recurso Especial. Comissão de corretagem. Negócio imobiliário. Celebração de contrato de cessão e transferência de imóvel. Pagamento de sinal. Posterior arrependimento do comprador. Rescisão do contrato. Ausência de culpa da corretora. Comissão devida. Recurso não provido. 1. A execução movida por ora recorrida em face de ora recorrente está amparada em cheque emitido por este em favor daquela, a título de pagamento de comissão de corretagem, no valor de R$ 8.000,00. Nos embargos à execução, o executado, ora recorrente, refutou a exigibilidade do referido título de crédito, sob o fundamento de que o negócio jurídico, ao qual está vinculado, não se concluiu. 2. O cheque ostenta a natureza de título de crédito, portanto, é não-causal (CPC, art. 585, I), ou seja, em decorrência de sua autonomia e abstração, não comporta discussão sobre o negócio jurídico originário. Entretanto, se o cheque não houver circulado, estando, pois, ainda atrelado à relação jurídica originária estabelecida entre seu emitente (sacador) e seu beneficiário (tomador), é possível que se discuta a causa debendi. 3. Na hipótese em exame, conforme consta do v. aresto hostilizado, não houve circulação do cheque emitido e, a seguir, sustado. É, portanto, devida a oposição de exceções pessoais ao cumprimento da ordem de pagamento contida no referido título de crédito. 4. Embora o serviço de corretagem somente se aperfeiçõe quando o negócio é concretizado, dado o risco inerente à atividade, não se pode perder de vista que, nos negócios imobiliários - os quais dependem de registro do ato negocial no Cartório de Registro de Imóveis para fins de transferência e aquisição da propriedade e de outros direitos reais (CC/2002, arts. 1.227, 1245-1246) -, a interme-diação da corretora pode encerrar-se antes da conclusão da fase de registro imobiliário. Por certo, quando as partes firmam, de algum modo, atos, com mediação da corretora, que geram obrigatoriedade legal de proceder-se ao registro imobiliário, tal como ocorre no caso de celebração de promessa de compra e venda ou de pagamento de sinal, torna-se devida a percepção de comissão de corretagem, mormente quando eventual desfazimento do negócio não decorrer de ato praticado pela corretora. 5. No caso em exame, conforme salientado pelas instâncias ordinárias, houve uma fase preliminar de negociações, seguida de uma fase intermediária de celebração do contrato de cessão e transferência dos direitos e obrigações constantes de promessa de compra e venda, com o pagamento do valor de R$ 62.000,00 a título de sinal, sendo certo que essas duas etapas foram intermediadas pela corretora de imóveis. Com a celebração desse contrato encerrou-se o ofício da corretora, a qual deu por concretizada a venda, recebendo, naquela data, o cheque pós-datado referente à comissão de corretagem. A partir daí, o ora recorrente munido do contrato, providenciou, como lhe competia, o financiamento do restante do valor do imóvel junto a uma instituição financeira. Contudo, durante o trâmite do processo de financiamento imobiliário, o contratante discordou do valor das prestações a serem pagas, rescindindo o contrato e sustando o cheque em apreço. 6. Se havia documento válido a corroborar o negócio jurídico - suficiente para a exigência do registro imobiliário -, não obstante seu posterior desfazimento, é salutar reconhecer que a corretora alcançou o “resultado útil” da avença. Destarte, formalizado o contrato particular de cessão e transferência de imóvel entre as partes interessadas, o direito à percepção de comissão de corretagem é incontestável, ainda que, por posterior rescisão contratual, mas não por culpa da corretora, o negócio jurídico não alcance a fase de registro imobiliário. 7. As instâncias ordinárias, soberanas na análise e interpretação do acervo fático probatório dos autos, concluíram que não há cogitar na responsabilidade da corretora pela rescisão contratual, sobretudo porque ela apresentou as devidas informações quanto aos valores das parcelas do financiamento imobiliário, não podendo ser a ela imputada a culpa pela não concretização do negócio jurídico. Tem-se, nos termos das conclusões da c. Corte local, que a rescisão contratual decorreu de vontade externada pelo próprio contratante e sua esposa - provavelmente por insatisfação com o valor das prestações mensais do financiamento bancário. 8. Recurso especial a que se nega provimento. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Aldir Passarinho Junior, João Otávio de Noronha e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília, 17 de março de 2011(Data do Julgamento) Ministro Raul Araújo, Relator RELATÓRIO O Senhor Ministro Raul Araújo: Trata-se de recurso especial interposto por Roberto Branchelli Júnior, com fundamento nas alíneas a e c, do permissivo constitucional, contra acórdão, proferido pelo c. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado: \"APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. COMISSÃO DE CORRETAGEM. CASO CONCRETO. MATÉRIA DE FATO. É devida a comissão de corretagem, pois se verifica que a apelada realizou a aproximação das partes e a formalização do contrato de cessão e transferência do imóvel, que, posteriormente, restou rescindido. Assim sendo, havendo documento hábil - cheque - a instruir a execução e não tendo o apelante se desincumbido de provar a ausência de causa debendi, é de ser mantida a sentença na íntegra. POR UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.\" (fl. 230) Os embargos de declaração opostos foram rejeitados. Nas razões de recurso especial, o ora recorrente alega que o v. acórdão recorrido incorreu em violação ao art. 723 do Código Civil de 2002, salientando que: (I) \"embora a falha na corretagem estivesse comprovada, frente as informações erradas em relação ao valor das parcelas do financiamento, entenderam que a corretagem foi bem sucedida, alcançando o seu fim que era a compra do bem imóvel negociado\"; (II) \"o artigo 723 do CC é expresso em afirmar que corretor tem a obrigação de executar a mediação com diligência e prudência que o negócio requer, informando ao cliente sobre os riscos e valores do negócio, o que não ocorreu, ou ocorrer de forma errada, pois a informação sobre o valor das parcelas a serem pagas estava totalmente equivocado, ensejando o desfazimento do negócio, razão pela qual este artigo deve ser aplicado na presente demanda, sendo determinada inexigibilidade da cobrança de corretagem, pois ela foi defeituosa e deu origem ao desfazimento da compra e venda\". Sustenta, ademais, a existência de divergência jurisprudencial, no tocante à \"impossibilidade de pagamento de comissão de corretagem para casos em que o negócio não se perfectibilizou\", tendo em vista o que dispõe o art. 725 do Código Civil de 2002. Por fim, ressalta que, \"no caso dos autos, não houve arrependimento do recorrente, o que houve foi um vício no negócio, mais precisamente nos serviços prestados pela recorrida, pois esta deu informação falsa que levou a não concretização do negócio. Assim, não se pode dizer que houve desistência das partes, mas sim a não concretização do negócio por culpa da má prestação de serviço pela corretara de imóveis (...). Por tudo o que foi defendido, percebe-se que o cheque em questão foi corretamente sustado pelo recorrente, haja vista que a recorrida não faz jus ao pagamento de comissão, seja porque não ocorreu a compra e venda do bem ao qual estava mediando, seja porque a sua mediação foi tão desqualificada •••
(STJ)