Arras confirmatórias - Direito de retenção indevido
Comentário: O artigo 418 do Código Civil estabelece o que são as “arras confirmatórias”, ou seja, um valor dado em garantia inicialmente para confirmação do negócio, “o sinal”. Diferente das “arras penitenciais” que são aquelas obrigações devidas quando há o arrependimento por uma das partes. Se num contrato de compra e venda de imóvel em que são ajustadas somente as arras confirmatórias, não sendo estabelecidas as arras penitenciais (arrependimento), em caso de desfazimento do contrato por parte do comprador, o vendedor não terá direito de reter o valor dado em sinal, bem como deverá efetuar o pagamento dos honorários do corretor de imóveis que teve seu trabalho concluído de intermediar as partes, já que ao comprador não foi estabelecida no contrato nenhuma sanção pelo seu arrependimento. Apelação Cível n. 2011.036693-3, da Capital - Relator: Juiz Saul Steil - Data: 29/07/2011 Apelação Cível. Ação de cobrança. Compra e venda de imóvel. Sinal de pagamento. Arras confirmatórias. Contrato que não se perfectibilizou. Retenção indevida. Comissão de corretagem. Verba devida pela parte contratante dos serviços. Dano moral inexistente. Sucumbência recíproca caracterizada. Sentença reformada em parte. Recurso conhecido e parcialmente provido. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2011.036693-3, da comarca da Capital (2ª Vara Cível), em que é apelante Rui Schneider da Silva, e apelados Brognoli Imóveis Ltda e outros: Acordam, em Terceira Câmara de Direito Civil, por votação unânime,conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento. Custas legais. RELATÓRIO Brognoli Imóveis Ltda., Luciaelena Maia Galvão e Marcelo Batista Corrêa ajuizaram ação de execução, sob o n. 023.05.027893-5, contra Rui Schneider da Silva, informando que a primeira requerente foi contratada pelos demais para intermediar a venda de um imóvel, sendo firmado com o requerido um instrumento de recibo de sinal e princípio de pagamento no valor de R$10.000,00 (dez mil reais), sendo referido valor pago por meio de cheque, ficando ainda acertado o pagamento de R$132.000,00 (cento e trinta e dois mil reais) por ocasião da assinatura do contrato particular de compra e venda, bem como o pagamento de R$73.000,00 (setenta e três mil reais) oriundos do recurso do FGTS. Aduziram que o cheque repassado pelo requerido retornou, em virtude de contra-ordem deste, restando evidenciado que os demais compromissos firmados pelo requerido não seriam honrados. Aventaram que o direito de arrependimento não constou expresso no contrato, tanto que foi consignado que este era irretratável, informando que o sinal dado pelo executado é considerado como arras confirmatórias. Sustentaram que comprovado que a rescisão contratual ocorreu por culpa do requerido, traduz-se como indenização justa a retenção do valor pago a título de arras confirmatórias, devendo ainda ser o requerido condenado ao pagamento dos honorários de corretagem na forma prevista no pacto firmado. Pugnaram pela expedição de mandado de citação para que o executado efetivasse o pagamento do débito em 24 (vinte e quatro) horas. No despacho de fl. 17 foi determinada a emenda da inicial para excluir da execucional o valor descrito no instrumento de recibo de sinal de negócio e princípio de pagamento e a apresentação do título original do cheque, refazendo a memória de cálculo, sob pena de indeferimento da inicial. Os requerentes peticionaram informando que a inicial deveria permanecer como inicialmente proposta e, tendo em vista que o requerido não havia sido citado, pleitearam a alteração de procedimento, autuando-se a presente como ação condenatória, de procedimento ordinário, para determinar que o réu pague o valor referente ao cheque que fora devolvido e a comissão de corretagem, incluindo os acréscimos legais. A execucional fora convertida em ação ordinária de cobrança, conforme despacho de fl. 22. O requerido compareceu aos autos apresentado reconvenção (fls. 43/54), aduzindo que buscou a primeira requerente para efetivar a compra de um imóvel que tivesse como característica a localização na região central da capital e que o valor cobrado a título de condomínio não poderia ser superior ao valor de R$270,00 (duzentos e setenta reais). Afirmou que o corretor, ao apresentar o imóvel, informou que o valor de condomínio era de R$254,00 (duzentos e cinquenta e quatro reais). Após a confirmação das condições para compra do bem o negócio foi efetivado. No entanto, ao visitar o imóvel e em conversa com a síndica, foi informado que o real valor pago pelos condôminos girava em torno de R$400,00 (quatrocentos reais) mensais. Diante de tais fatos, o reconvinte procurou o corretor para desfazer o negócio, tendo em vista o descumprimento contratual, sendo informado que a negociação seria desfeita e que o cheque ofertado como \"sinal\" lhe seria devolvido pela imobiliária. O que de fato não ocorreu, por conta dos proprietários do bem que se recusaram a devolver o cheque e queriam o pagamento de multa pelo desfazimento do negócio. Aventou que notificou a reconvinda sobre tais problemas. Versou a respeito do desacordo contratual; da obrigatoriedade da devolução do cheque em poder dos reconvindos; do direito à devolução das arras, nos termos do art. 418, do CPC; da aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao presente caso; e o direito à indenização a título de danos morais. Requereu a procedência da reconvenção para condenar os reconvindos-requerentes ao pagamento de indenização por danos morais, a restituição do valor equivalente ao pagamento das arras e a restituição do cheque. Na mesma oportunidade, o requerido apresentou contestação (fls. 55/104) reprisando os mesmos fatos narrados na reconvencional. Versou ainda a respeito do descumprimento contratual por parte dos requerentes; do sinal de pagamento identificado como arras que devem ser devolvidos ao requerido, nos termos do art. 418, do CPC; da inexistência do dever de pagar honorários de comissão de corretagem; da litigância de má-fé; e por fim, pleiteou pela improcedência da demanda principal. Réplica às fls. 111/121 e contestação à reconvenção às fls. 122/133. Réplica à reconvenção às fls. 140/150. Realizada audiência (fls. 188 e 189) em que a proposta conciliatória restou inexitosa. Na mesma oportunidade foi ouvida 01 (uma) testemunha por parte do requerido (fl. 190) e realizadas as alegações finais orais. Sobreveio decisão (fls. 192/199) em que o douto sentenciante julgou procedente o pedido exordial e improcedente o pedido da reconvenção. Condenou o réu ao pagamento de R$10.000,00 (dez mil reais) aos requerentes, proprietários do imóvel, a título de arras confirmatórias, e ao pagamento da comissão de corretagem à imobiliária, no valor de R$12.900,00 (doze mil e novecentos reais), devendo ambos os valores serem atualizados monetariamente pelo INPC, a contar de 02/03/2005 e acrescidos dos juros de mora de 1% ao mês, a contar da data da citação. Custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação, por conta do requerido. O requerido apresentou embargos de declaração (fls. 203/206), os quais não foram conhecidos, conforme decisão de fl. 208. Novos embargos aclaratórios foram apresentados pelo requerido (fls. 211/215), sendo novamente rejeitados, de acordo com a decisão de fls. 217 e 218. Irresignado com a prestação jurisdicional entregue, o requerido apresentou recurso de apelação (fls. 222/250) repisando os fatos narrados quando da apresentação da peça contestatória e da reconvenção, enfatizando que ao determinar a aplicação do CDC, o magistrado deveria inverter o ônus da prova, em virtude da hipossuficiência do requerido e que os requerentes não negaram a condição da compra vinculada ao valor do condomínio. Ainda, que o magistrado desconsiderou, mesmo aplicando o CDC, a cláusula leonina no que diz respeito a comissão de corretagem, devendo ser considerada nula. Versou a respeito da indenização por dano moral, sendo esta devida em razão da conduta ilegal e abusiva dos requerentes, seja pela retenção do cheque, seja pela negativa da devolução das arras em dobro, seja pela interposição ilegítima de ação de cobrança de valores não devidos. Pugnou pela inversão dos ônus sucumbenciais em caso de provimento do presente reclamo ou, caso contrário, a redução do percentual arbitrado de verba honorária em favor da parte adversa. Requereu o conhecimento e provimento do recurso para reformar a decisão de primeira grau. Contrarrazões às fls. 256/269. Os autos ascenderam à esta Corte. É o breve e necessário relato. VOTO Conheço do recurso porquanto presentes os requisitos legais de admissibilidade. Insurge-se o apelante contra a decisão de primeiro grau que julgou procedente o pedido exordial formulado pelos apelados e improcedente o pedido reconvencional, condenando o apelante ao pagamento de R$10.000,00 (dez mil reais) a título de arras confirmatórias aos proprietários do imóvel e a comissão de corretagem à imobiliária, correspondente a 6% do valor total do bem transacionado. Alegou preliminarmente que o juiz a quo ao determinar a aplicação do CDC, deveria automaticamente inverter o ônus da prova, em virtude da hipossuficiência do requerido/apelante. A esse respeito, em que pese o reconhecimento da aplicabilidade do código consumerista, há que se salientar não ser automática a aplicação do dispositivo que permite a inversão do ônus probandi, ficando à mercê do magistrado a verificação da sua necessidade diante do caso concreto. É nesta direção que o Egrégio Superior Tribunal de Justiça vem pautando as suas decisões: A chamada inversão do ônus da prova, no Código de Defesa do Consumidor, está no contexto da facilitação da defesa dos direitos do consumidor, ficando subordinada ao \"critério do juiz, quando for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência\" (art. 6º, VIII). Isso quer dizer que não é automática a inversão do ônus da prova. Ela depende de circunstâncias concretas que serão apuradas pelo juiz no contexto da facilitação da defesa dos direitos do consumidor. (STJ, 3ª T. Resp 171.988/RS, rel. Min. Waldemar Zveiter, j. 24-5-1999, v.U.). Vale ressaltar que a aplicação do art. art. 6.º, VIII do CDC permite a inversão do ônus da prova quando for verossímil a alegação do consumidor ou tratar-se ele de pessoa hipossuficiente, harmonizando-se a interpretação deste dispositivo com a regra contida no artigo 333 do Código de Processo Civil. Tal possibilidade, assinale-se, nada mais é do que um consectário do princípio constitucional da isonomia, tendo a Lei Consumerista expressamente reconhecido a vulnerabilidade do consumidor em face do fornecedor de produtos ou serviços (art. 4.º, I). Assim, a inversão do ônus da prova não é um efeito automático diante do reconhecimento da aplicabilidade do legislação consumerista ao presente caso. O apelante, quando apresentou a sua defesa em juízo, argumentou que desistiu da compra e venda do imóvel, mesmo após ter assinado do recibo de sinal de negócio e princípio de pagamento e dado o cheque no valor de R$10.000,00 (dez mil reais), confirmando o negócio entre as partes, sustentando que a compra estava condicionada ao valor do condomínio, ou seja, o apelante só compraria o imóvel de acordo com a localização do bem, na região central de Florianópolis, e também que a taxa condominial deveria ser de até R$270,00 (duzentos e setenta reais). Referida alegação foi trazida pelo apelante em sua defesa, para justificar ser indevida a cobrança que lhe era feita, sendo assim, tal prova era de responsabilidade do próprio apelante, nos termos do •••
(TJSC)