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BDI Nº.22 / 2013 - Comentários & Doutrina Voltar

A força probante do compromisso de compra e venda de imóvel sem registro – Parte II - Final

Comentário do BDI: O compromisso de compra e venda sem firma reconhecida protege o comprador contra uma possível penhora sofrida pelo vendedor? Veja a resposta aqui! 6. DA FORÇA PROBANTE DO COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA SEM REGISTRO Carece de maior reflexão o peso probatório a ser dispensado a contratos particulares isolados, não registrados e desacompanhados de mínima nota de publicidade, a exemplo de reconhecimento de firma das partes ou extração de cópia autenticada do instrumento. Para se incursionar no tema, contudo, necessário conhecer a forma e o meio de prova do negócio jurídico de compra e venda. Dispensa-se a forma solene. A saber, razões de ordem prática impõem forma livre ao compromisso de compra e venda (art. 107, Código Civil)[12], cuja aparente insegurança é contra-balançada pela exigência de registro do contrato no Cartório de Imóveis como condição para se atribuir direito real ao compromissário comprador[13]. Prova disso são os sucessivos diplomas legislativos que contemplaram essa espécie contratual, a começar pelo Decreto-lei 58/37 (art. 11), Lei 649/49, Lei 6.776/79 (art. 26) e o artigo 1.417 do atual Código Civil que, sem exceção, admitiram sua celebração por instrumento particular. Portanto, a escritura pública apenas é exigida posteriormente para transmissão da propriedade (art. 108, Código Civil)[14]. Quando se averigua a prova da compra e venda celebrada por instrumento particular, em especial a sua repercussão na esfera jurídica de terceiro, convém trazer a lume regra de ouro estabelecida no artigo 221 do Código Civil, in verbis: Art. 221. O instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por quem esteja na livre disposição e administração de seus bens, prova as obrigações convencionais de qualquer valor; mas os seus efeitos, bem como os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros, antes de registrado no registro público. (destacou-se) Da norma em apreço deflui desnecessário o reconhecimento de firma para tornar válido o contrato entre as partes[15]. No entanto, terceiros permanecem imunes aos seus efeitos, inclusive quando o negócio envolva cessão de direitos, se o instrumento não for levado a registro público. Em suma, somente atinge terceiros aquele contrato ao qual se conferiu a necessária publicidade. Sobre o assunto assim pontificou Roberto Senise Lisboa[16]: “O registro público é meio de se dar publicidade aos atos a ele submetidos, cuja efetividade passa a atingir não só as partes, mas também a terceiros. Assim, para que o instrumento particular tenha efeitos erga omnes, e não meramente inter partes, mister sua inscrição no registro público.” Contudo, cediço que a Súmula 84 do Colendo STJ, arraigada em questões sociológicas, faz vista grossa da norma em apreço, assim como dos artigos 129, § 9.º e 167, I, 9, ambos da Lei 6.015/73[17] (Lei de Registros Públicos), aplicáveis, respectivamente, ao registro de títulos e documentos em geral e de imóveis. O Superior Tribunal de Justiça preferiu conferir interpretação finalística à Lei de Registros Públicos[18]: com o escopo de alcançar justiça social preteriu a exigência do registro público, condição legal para eficácia do negócio jurídico perante terceiros (artigo 221 do Código Civil). Por isso autorizou o manejo dos embargos de terceiro embora inexistente registro público do contrato. Porém, em que pese a opção pretoriana pela desnecessidade do registro público, nem por isso, no palco do debate judicial, o instrumento particular sempre e sempre servirá de prova inconteste quanto à data da compra e venda. Se oposto a terceiro que não participou de sua formação, caso do credor penhorante, a datação do instrumento particular deverá obedecer a uma das balizas ministradas pelo legislador no artigo 370 do Código de Processo Civil, in verbis: Art. 370. A data do documento particular, quando a seu respeito surgir dúvida ou impugnação entre os litigantes, provar-se-á por todos os meios de direito. Mas, em relação a terceiros, considerar-se-á datado o documento particular: I - no dia em que foi registrado; II - desde a morte de algum dos signatários; III - a partir da impossibilidade física, que sobreveio a qualquer dos signatários; IV - da sua apresentação em repartição pública ou em juízo; V - do ato ou fato que estabeleça, de modo certo, a anterioridade da formação do documento. (destacou-se) Entre os signatários do documento, surgindo dúvida quanto à data, é dado prová-la por todos os meios admitidos em direito. Porém, perante terceiro que não participou da sua formação, presume-se datado o documento a partir de quando verificada uma das hipóteses acima. Antônio Carlos de Araújo Cintra ensina que essas presunções não são propriamente a data da celebração do negócio; mas sim o último limite temporal para a formação do documento. Por isso devem prevalecer perante terceiro, pois a ele mais benéfico. Ressalva o eminente processualista a possibilidade de se demonstrar, a quem interessar, que o documento, na verdade, foi sim elaborado em momento anterior ao resultante da aplicação da presunção, que sendo relativa admite prova em contrário[19]. Descartada a hipótese do inciso I, pois aqui se cogita justamente de instrumentos particulares sem registro público (contrato de gaveta), bem como aquelas presentes nos incisos II e III, estranhas à problemática deste estudo, as duas últimas (IV e V) são as mais hábeis a solver litígios instaurados em razão de imóveis negociados por compromisso particular de compra e venda sem registro. Conforme assaz sublinhado, em sede de embargos de terceiro, no embate instaurado com o credor penhorante, nenhum valor deve merecer o instrumento particular sem registro e despido do menor resquício de publicidade, a exemplo de reconhecimento de firma dos signatários ou extração de cópia autenticada do respectivo documento. É que esses atos, praticados por registrador e tabelião no exercício de função pública, agregam segurança jurídica ao negócio, tornando incontroverso que a compra e venda ocorreu em momento anterior à sua prática. Por isso amoldam-se às hipóteses dos incisos IV e V do art. 370. Assim, desnecessária maior digressão para se concluir que o reconhecimento de firma dos signatários, seja no momento da lavratura do contrato, seja posteriormente (desde que antes do aparelhamento da execução responsável pela penhora do imóvel), bastaria para resguardar o compromissário comprador de ter o seu imóvel apreendido em ação movida em face do promitente vendedor, ainda titular do domínio segundo o artigo 1.245, § 1.º, do Código Civil: “Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido •••

José Eduardo Battaus*