REPRESENTAÇÃO DE INCAPAZES
Esse assunto foi tratado no BDI nº 1 - 1º decêndio de 1998, tendo sido admitida duas hipóteses de representação de menores absolutamente incapazes: uma na compra de imóvel representado pela mãe solteira e relativamente incapaz assistida por seu pai e outra de adoção representado exclusivamente pela mãe, também solteira e relativamente incapaz. Tenho entendimento contrário para as duas situações, as quais giram em torno do problema da capacidade e do exercício do pátrio poder. A validade do ato jurídico requer agente capaz (CC, art. 82), quer dizer, pessoa dotada de consciência e vontade e reconhecida pela lei como apta a exercer todos os atos da vida civil. As pessoas absolutamente incapazes (art. 5º) são representadas por seus representantes legais e as relativamente incapazes (art. 6º) por estes assistidas, conforme preceituam os artigos 84 e 384, V, do Código Civil. De acordo com esses artigos, o incapaz exerce seus direitos por intermédio dos respectivos representantes. Idêntica disposição se encontra no Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 146). Representação é relação jurídica pela qual uma pessoa se obriga diretamente perante terceiro, através do ato praticado em seu nome por um representante ou intermediário. Os pais, tutores e curadores são representantes legais, pois recebem da lei a investidura que os credenciam a representarem os incapazes em todos os atos da vida civil. Na representação disciplinada pelo artigo 84, se contém medida de proteção e defesa; praticados por outra forma, a sanção é a nulidade. Capacidade é a aptidão para ser sujeito de direitos e obrigações e exercer por si ou por outrem atos da vida civil. A capacidade de gozo ou de direito é ínsita ao ente humano; todos a tem, não podendo dela serem privados (CC, art. 2º). A capacidade do exercício ou de fato é a aptidão para exercer direitos, de os fazer valer. Se a capacidade de gozo é imanente a todo ser humano, a de exercício ou de fato deste pode ser retirada. O exercício dos direitos pressupõe realmente consciência e vontade; por conseguinte, a capacidade de fato subordina-se à existência no homem dessas duas faculdades. Essa capacidade acha-se assim, vinculada a determinados fatores objetivos: idade e estado de saúde. O incapaz (menor, interdito e outros) exerce seus direitos através dos respectivos representantes legais (art. 84). Somente após os 21 anos de idade ou antes, na ocorrência de um dos fatos enunciados no artigo 9º o indivíduo acha-se apto à prática de todos os atos da vida civil. Poderá ainda, em alguns casos, expressamente previstos em lei (v.o. testar, ser testemunha, votar, celebrar contrato de trabalho, etc) exercer a capacidade de fato antes da ocorrência dos eventos colacionados no artigo 9º. Porém, ao meu entender, como demonstro adiante, não pode o menor carecedor de representação legal exercer o direito de representação de filho seu. O próprio artigo 84 do Código Civil, na sua parte final, restringe a prática de atos pelos relativamente incapazes ao que for por ele determinado. Não vislumbro nenhum artigo que permita o menor exercer direito de representação sobre filho seu, quer se faça essa representação diretamente por ele ou através de seu representante ou seja representação sucessiva. Clóvis Bevilacqua (Código Civil Comentado, 12ª edição, Livraria Francisco Alves, 1960), assim se manifesta: "Não é a aptidão para procriar, que nos deve servir de base, quando tratamos de examinar se o indivíduo está ou não, em condições de tomar parte ativa nas relações da vida jurídica. E ao desenvolvimento mental, ao poder de adaptação às condições da vida social, etc, que se deve atender, para aflouxarem-se os liames da tutela da lei e permitirem-se as experiências da atividade livre. O ponto de vista da capacidade genésica é limitado; o campo do direito civil é mais amplo." Aos indivíduos, às vezes faltam requisitos materiais para dirigirem-se com autonomia no mundo civil. Embora não lhes negue a ordem jurídica a capacidade de gozo ou de aquisição, recusa-lhes a autodeterminação, interdizendo-lhes o exercício dos direitos pessoal e diretamente, porém condicionado sempre à intervenção de uma outra pessoa, que os representa ou assiste. A ocorrência de tais deficiências importa em incapacidade. Aquele que se acha em pleno exercício de seus direitos é capaz ou tem a capacidade de fato, de exercício ou de ação; aquele a quem falta a aptidão para agir, não tem a capacidade de fato. Concluo dessa acertiva do mestre Caio Mário da Silva Pereira (Instituições de Direito Civil, Vol. I, Forense, 12ª edição, 1990) que, o indivíduo que não tem capacidade de agir pessoalmente, muito menos a tem para representar alguém. Entendo que, o ato de representação requer agente capaz (art. 82); se lhe falta tal aptidão compete ao juiz dar-lhe substituto legal (tutor, CC, art. 383, parte final) ou curador especial (ECA, art. 142, parágrafo único). É defeso ao Tabelião suprir a incapacidade do representante do menor, mesmo pela assistência de avós, porquanto haveria representação ou assistência simultânea ou indireta, vulgarmente denominada "por tabela", não prevista em lei. Podem os avós assistir ou representar seus filhos, mas, não podem suprir a incapacidade representativa dos mesmos em relação aos netos. Se, reconhecida como válida tal forma de representação, também aceitável a representação que pais absolutamente incapazes fariam a seus filhos, desde que estivessem representados por avós. A geração de filhos leva ao surgimento do pátrio poder dos pais: mas, o fato de gerar não os torna capazes; a capacidade somente se adquire por uma das formas previstas no artigo 9º do Código Civil. Existem algumas excessões relativamente ao exercício de determinados atos, algumas já enumeradas, mas nenhuma relativa ao assunto ora focado. Observe-se a respeito que, nosso Código Civil foi elaborado nos primórdios desse século, quando vigia rigoroso moralismo. A filiação pressupunha origem no casamento; apenas em alguns tópicos procurou o legislador traçar alguns parâmetros a respeito da filiação extramatrimonial, dita ilegítima. Por exemplo, o artigo 383, que trata justamente do pátrio poder sobre filho ilegítimo não reconhecido pelo pai (mutatis mutandis, verifica-se também diversos casos de maternidade não reconhecida), dispõe que o mesmo fique sob o •••
Bel. Aldemir Reis - 4º Notário em São Bernardo do Campo - SP