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BDI Nº.6 / 2000 - Assuntos Cartorários Voltar

ATO JURÍDICO NULO, ANULÁVEL, INEXISTENTE E INEFICAZ

Antes de ingressarmos no campo jurídico e na análise do alcance que cada expressão significa para o direito, é indispensável o estudo da etimologia de cada palavra, para buscarmos, pela descoberta da raiz de cada uma, o significado que possibilite a comparação, de maneira a serem aferidas as distinções entre elas. Explicam nossos dicionários que nulo é aquilo que não é válido, isto é, não vale nada, não tem expressividade, é igual a zero. Anular, por outro lado, tem o significado de tornar nulo, invalidar, abolir, destruir, eliminar, aniquilar. Inexistente é tudo aquilo desprovido de existência, o que não existe, o que não é. Ineficaz é o improdutivo, que não tem eficácia, que não produz efeito; que existe, mas dele nada emana, não se extrai nenhum resultado; inútil. Feito esse preâmbulo, constatamos que juridicamente os termos são, amiúde, confundidos e utilizados de maneira incorreta, imprecisa, equivocada, comprometendo o raciocínio lógico, a coerência e a conseqüência que deve conter toda a argumentação em direito. Com efeito, as confusões somente ocorrem pela falta de atenção e pela leitura apressada, conduzidas pelo açodamento na conclusão, na precipitação da análise de cada expressão e do conteúdo de seus significados, os quais, longe de serem semelhantes ou mesmo sinônimos, são distintos, antagônicos, ainda que, pela etimologia jurídica, guardem semelhanças entre si. Vejamos então a distinção jurídica de cada expressão. Segundo De Plácido e Silva, “na terminologia jurídica, o nulo é rigorosamente tomado no sentido de inexistente, ineficaz, que não pode produzir efeitos jurídicos”. (...) “Nulo é tudo o que se faz contra a lei, ou seja, todo ato praticado com ofensa aos princípios fundamentais da ordem jurídica ou garantidores dos interesses coletivos. A qualidade de nulo, assim, é imposta pela lei em razão de ordem pública, para que não se desrespeite a própria lei. Dela é que se gera a nulidade”. (Vocabulário Jurídico. Forense, 1982, vol. III, p. 260). Portanto, todo ato jurídico que afrontar os princípios de direito, no qual faltarem os requisitos substanciais para a sua validade, que for contrário à lei e ao ordenamento jurídico, é considerado um ato nulo. A nulidade que macula o ato é uma pena àquele que transgrediu a lei e os princípios jurídicos fundamentais para a validade do ato. Se a lei lhe vedava a prática ou lhe impunha a obediência a certas regras, que voluntária ou involuntariamente foram transgredidas ou não atendidas, a sanção é a nulidade do ato, aniquilando-o no nascedouro, tornando-o igual a zero, demonstrando no mundo jurídico que não vale nada, não tem expressividade jurídica, está desprovido de eficácia de direito. O ato jurídico nulo é, por assim dizer, um natimorto, fulminado com o vício em sua origem, que o impossibilita de sobreviver. É como se não tivesse existido, como se não tivesse sido praticado. Gerado contra a lei, maculado com a eiva da antijuridicidade, a conseqüência de sua concepção é o seu aborto jurídico, impedindo-o de ter sobrevida. Assim é que a própria lei ordena quais os atos passíveis de nulidade absoluta. Vejamos. O ato é nulo quando praticado por pessoa absolutamente incapaz (art. 145, inciso I, do Código Civil). Mas quem são os absolutamente incapazes? Dispõe o artigo 5º, incisos I a IV do Código Civil, que “são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: os menores de 16 anos; os loucos de todo o gênero; os surdos-mudos, que não puderem exprimir a sua vontade; os ausentes, declarados tais por ato do juiz”. (arts. 1.159 e seguintes do C.P.C). Conclui-se, portanto, que essas pessoas não podem agir sozinhas, visto que devem ser representadas, para que o ato jurídico de que participam possa ter validade; caso contrário, nulo será. O ato será nulo, dispõe o art. 145, II, do Código Civil, quando for ilícito, ou impossível, o seu objeto. Evidentemente, o objeto do ato jurídico, sendo ilícito ou impossível, não tem acolhida pelo direito, porque afronta a norma legal ao contrapor-se aos princípios de moralidade e seriedade que a norteiam. Com efeito, determina o art. 130 do C.C. que “não vale o ato, que deixar de revestir a forma especial, determinada em lei (art. 82), salvo quando esta comine sanção diferente contra a preterição da forma exigida”. Nesse sentido, confiram-se os dispostos nos artigos 207 e 208, parágrafo único e incisos I e II, 765 e 823 do Código Civil, entre outros. O ato jurídico também será nulo quando não revestir a forma prescrita em lei (inc. III, art. 145, CC). Ora, a forma do ato jurídico, conforme estabelecem os arts. 129 e seguintes do Código Civil, será livre, quando a lei expressamente não exigir forma especial. E a lei exige, para a validade do ato jurídico, agente capaz (art. 145, I), objeto lícito (art. 145, II) e forma prescrita ou não defesa em lei (arts. 129, 130 e 145 do CC). Assim sendo, é substancial para a validade do ato jurídico, por exemplo, que no casamento e no testamento seja a solenidade do ato elaborada de acordo com a forma prevista na lei. Da mesma forma, estará o ato jurídico inquinado de nulidade absoluta “quando for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade” (art. 145, inc. IV, CC). Num testamento, por exemplo, a presença de cinco testemunhas instrumentais é essencial para a sua validade. A falta de apenas uma delas resulta na invalidade do ato em razão da ofensa à formalidade essencial. E essa preterição da formalidade indispensável gera a nulidade absoluta do ato, tornando-o inválido. Da mesma forma, um casamento realizado com infração aos dispositivos contidos no art. 183, incisos I a VIII, é nulo, porque contraria a disposição legal •••

Antônio Sérgio Albergaria Pereira (*)