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BDI Nº.3 / 1994 - Assuntos Cartorários Voltar

ESCRITURA DE DESAPROPRIAÇÃO AMIGÁVEL DE IMÓVEL E A CADUCIDADE DO DECRETO EXPROPRIATÓRIO

Antonio Albergaria Pereira - Advogado e ex-notário A desapropriação é ato exclusivo do Poder Público. Ele ou uma entidade que o integra, apossa-se compulsoriamente da propriedade imobiliária de alguém, mediante pagamento prévio do valor do bem desapropriado. 2. A desapropriação é uma afetação, ou seja, é uma lesão ao patrimônio do particular, praticado pelo Poder Público, fundado num INTERESSE SOCIAL maior. Fixemos esta particularidade: a tônica predominante na desapropriação de um imóvel é o INTERESSE SOCIAL. 3. Tal poder não é exercido arbitrariamente pelo Poder Público, notadamente com relação ao direito de propriedade imobiliária. Preceito constitucional estabelece que o PROCEDIMENTO DA DESAPROPRIAÇÃO deve estar estabelecido em lei e ter como fundamento, além da justa e prévia indenização, a NECESSIDADE OU UTILIDADE PÚBLICA OU O INTERESSE SOCIAL. (Art. 5º, XXIV da C.F.) 4. A desapropriação inicia-se com um ato administrativo emanado do Poder expropriante, declarando o imóvel a ser desapropriado, de utilidade pública ou de INTERESSE SOCIAL. Esse ato administrativo, devidamente formalizado, permite que o Poder expropriante entre em COMPOSIÇÃO AMIGÁVEL com o proprietário do imóvel e com ele fixe o valor do mesmo e sua transferência para o domínio do Poder Público, ou então, não ocorrendo tal acordo, ingresse em Juízo e, mediante procedimento judicial, obtenha, em seu favor, a adjudicação compulsória do imóvel desapropriado. 5. O ato administrativo que permite o PODER PÚBLICO desapropriar um imóvel pode ser assim desdobrado: a) FASE DE COMPOSIÇÃO AMIGÁVEL, b) FASE JUDICIAL. São fases distintas e de conseqüências diversas. A primeira se conclui por um ACORDO. A segunda se encerra com uma sentença judicial. Ocorrendo a primeira hipótese - e é ela que aqui iremos apreciar - temos a DESAPROPRIAÇÃO EXTRAJUDICIAL que se formaliza através de ESCRITURA DE DESAPROPRIAÇÃO AMIGÁVEL lavrada por um notário. 6. O art. 10 do Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1951, estabelece: “A desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo OU intentar-se judicialmente, dentro de cinco nos, contados da expedição do respectivo decreto e findos os quais este caducará.” O verbo “caducar”, contido no preceito transcrito, pode ser acolhido no sentido de prescrição, de nulidade, de extinção do prazo de validade, e até mesmo como revogação do direito nele expresso pelo não uso no prazo estabelecido. O decreto, dentro do prazo de sua validade, permite que o Poder Público tome uma destas providências: PRIMEIRO, entre em acordo com o proprietário do imóvel e dele obtenha para si a transferência do domínio sobre o imóvel, ou ingresse em Juízo. O preceito transcrito tem uma segunda parte, que esclarece: “Neste caso - anotamos, decreto caduco - somente decorrido um ano, poderá ser o mesmo objeto de nova declaração. 7. O que se indaga é: um decreto expropriatório caduco impede que o Poder Público e o particular, com base nesse mesmo decreto caduco, se componham amigavelmente e o imóvel expropriado seja transferido do particular para o domínio do Poder expropriante, mediante escritura pública de desapropriação amigável? Já divulgamos o entendimento de respeitável autoridade judiciária do Estado de Mato Grosso do Sul decidindo, em caráter normativo, que o notário não deve lavrar tal escritura, e o Oficial Registrador não deve registrá-la se lavrada. 8. Atenciosamente, ousamos discordar de tal entendimento, notadamente quando impede que o notário lavre tal escritura. É o que iremos esclarecer. Embora caduco esteja o decreto, a necessidade ou a utilidade pública ou até mesmo o interesse social perdurem, e o proprietário, reconhecendo uma dessas condições, acolha uma proposta de composição amigável e transfira tal imóvel para o Poder expropriante. 9. A caducidade do decreto é uma garantia para o proprietário do imóvel. O direito de acolher o acordo é um direito potestativo. É um direito do expropriado exclusivamente. Com esse característico de direito potestativo, o expropriado, considerando a caducidade do decreto, pode não acolher o acordo proposto. Contudo, data máxima vênia dos que entendem de forma contrária, não está ele impedido de compor-se amigavelmente com o Poder expropriante, receber o valor ofertado e transferir o imóvel para o domínio do mesmo. A aceitação da proposta é um direito do expropriado e não uma obrigação de aceitá-la, esteja o decreto no prazo de vigência ou exaurido tal prazo. Com a caducidade do decreto expropriatório, o Poder Público fica impedido sim de intentar a ação judicial, mas, entendemos, não está ele impedido de compor-se amigavelmente com o proprietário do imóvel. 10. No Direito Civil predomina o entendimento de que as partes têm ampla liberdade de contrair obrigações e exercer direitos, liberdade essa que dá validade às declarações de vontade de natureza privada, independentemente de forma especial (art. 129 •••

Antonio Albergaria Pereira - Advogado e ex-notário