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BDI Nº.8 / 1995 - Assuntos Cartorários Voltar

ALIENAÇÃO DA NUA PROPRIEDADE E DO USUFRUTO NUM SÓ TÍTULO

Tomamos conhecimento da decisão do MM. Juiz de Direito da 1ª Vara de Registros Públicos da Capital de São Paulo que, acolhendo parecer do Doutor Promotor de Justiça, entendeu ser IMPOSSÍVEL o registro de escritura de venda e compra de um imóvel, pela qual o nu-proprietário do mesmo, concomitantemente, ou seja, na mesma escritura, com o usufrutuário, vende-o a um terceiro, no caso enfocado ao outorgado comprador. Tanto o parecer como a sentença são ATOS PÚBLICOS, e, por essa circunstância, tomamos conhecimento de ambos. Discordamos da conclusão da sentença e também do parecer. É direito nosso, o de discordar, quando o nosso entendimento é oposto. Vamos aqui expor o nosso entendimento, sem propósito de crítica aos que adotam entendimento contrário. Ao registrar nosso entendimento nesta exposição, destacaremos os tópicos do parecer e da sentença que motivam nossa discordância. Para que interessados no assunto tenham total conhecimento do mesmo, ao concluirmos nossa exposição transcreveremos ipsis litteris o parecer e a sentença, a fim de que os tópicos por nós destacados e comentados não se apresentem como afirmativas isoladas, divorciadas do texto integral. 1 ­ Do parecer do Doutor Promotor Público consta: O REGISTRO DA ESCRITURA FOI NEGADO PORQUE O ILUSTRE OFICIAL SUSCITANTE CORRETAMENTE ENTENDEU QUE O USUFRUTO NÃO PODE SER OBJETO ALIENAÇÃO (sic) A TERCEIROS QUE NÃO O NÚ-PROPRIETÁRIO (Art. 717 do Código Civil) Aprovando esse entendimento do Oficial Registrador, o Doutor Promotor Público registra em seguida o seu entendimento assim exposto: A INALIENABILIDADE DO USUFRUTO (QUE NÃO SE FAÇA CONFUSÃO COM A PERMISSÃO DE CESSÃO DE USO ­ ALIENAÇÃO DO SEU EXERCÍCIO ­ em que O USUFRUTUÁRIO EXERCE SEU DIREITO POR TERCEIRO) É DE SUA PRÓPRIA NATUREZA, QUE, COMO ENSINA LAFAYETTE PERTENCE : CLASSE DOS DIREITOS INTRANSMISSÍVEIS, NÃO PODENDO O USUFRUTUÁRIO DESPOJAR-SE DELE PARA ALIENÁ-LO A TERCEIRO POR TÍTULO ONEROSO OU GRATUITO 2 ­ A sentença não só elogia o zelo do oficial registrador como também aprova o entendimento do nobre Doutor Curador pela impossibilidade do registro da escritura e reportar-se à doutrina exposta por autorizados mestres, inclusive do eminente SERPA LOPES, para concluir: NO CASO SUB-EXAME, SE VERIFICA A ALIENAÇÃO DO USUFRUTO A TERCEIRO, O QUE É INCONCEBÍVEL, CONSOANTE JÁ RELATADO, O QUE OBSTA TERMINANTEMENTE, O REGISTRO DO TÍTULO. Vai além: CONSIDERANDO A LAVRATURA DO ATO NOTARIAL EM TOTAL DISSONÂNCIA COM O DIREITO POSITIVO, O QUE PODE CONFIGURAR `IN THESIS´, PRÁTICA ADMINISTRATIVA-DISCIPLINAR PUNÍVEL, DETERMINO A REMESSA DE CÓPIA FIEL DESTES AUTOS AO MERITÍSSIMO JUIZ CORREGEDOR PERMANENTE DO (omissis) TABELIONATO DE NOTAS DA CAPITAL, PARA AS PROVIDÊNCIAS QUE ENTENDER CABÍVEIS. O assunto interessa a todos: notários e registradores. O comportamento do oficial foi exaltado. O do notário foi censurado. Quem agiu corretamente? O Oficial ou o notário? É o que aqui iremos apreciar, dentro da finalidade do BOLETIM CARTORÁRIO. 3 ­ Primeiramente queremos aqui colocar em destaque que o USUFRUTO não é um direito absolutamente inalienável. O Art. 717 do Código Civil permite que seja ele ALIENADO ao proprietário da coisa, no caso o imóvel. Alienação é termo genérico, pelo qual se designa todo e qualquer ato que tem efeito de transferir o domínio de uma coisa para outra pessoa, seja por venda, por troca ou por doação (cf. VOCABULÁRIO JURÍDICO ­ DE PLÁCIDO E SILVA). 4 ­ O direito de propriedade, por força de texto expresso de lei, confere ao proprietário da coisa ­ no caso o imóvel ­ o direito de usar, gozar e dispor do mesmo (Art. 524). O artigo 525 do mesmo Codex, esclarece que a PROPRIEDADE É PLENA quando todos os seus direitos se acham reunidos no do PROPRIETÁRIO; LIMITADA quando tem "nus real, ou é resolúvel. É o que ocorre com relação a um imóvel em que a nua propriedade é de uma pessoa e o "nus real do usufruto pertence a outra. Ninguém pode vender o que não possui. Assim, o nu-proprietário não pode vender a PROPRIEDADE PLENA sobre um imóvel, se sobre este, por reserva ou por constituição, existe o "nus real do USUFRUTO. Este é o do usufrutuário, que só pode vender esse seu direito ao nu-proprietário (Art. 717 do CC.). Quando o nu-proprietário do imóvel vende a nua propriedade a uma pessoa, esta pessoa que a adquire, em nosso entendimento NÃO É TERCEIRO, mas sim o novo nu-proprietário do imóvel, pois, com a aquisição, sub-roga-se em todos os direitos do anterior proprietário. Se na mesma escritura o usufrutuário também vende AO MESMO ADQUIRENTE o seu direito real de usufruto, ele está vendendo o seu direito não a um terceiro, mas sim ao novo nu-proprietário. Isso se nos parece muito claro. Quando realizávamos serviços notariais, NUNCA TIVEMOS DÚVIDA EM LAVRAR ESCRITURAS DESSE JAEZ. Hoje, quando escrevemos sobre assuntos notariais no BOLETIM CARTORÁRIO, sempre nos manifestamos pela validade do ingresso de tais escrituras no Registro Imobiliário, sem qualquer restrição. Acreditávamos que esse assunto já estava pacificado nas atividades notariais e registrais, tanto porque o CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA DE SÃO PAULO, na apelação nº 3.278-0, apreciando recurso do Ministério Público da Comarca de Jahú, em caso idêntico ao ora apreciado, deixou expresso: A APELAÇÃO É NO SENTIDO DE QUE NÃO PODERIAM EM UMA ÚNICA ESCRITURA PÚBLICA SER ALIENADOS A PROPRIEDADE E O USUFRUTO DE UM MESMO BEM, PORQUE O ADQUIRENTE DA PROPRIEDADE PELO INSTRUMENTO PÚBLICO NÃO SE TORNA ANTES DO REGISTRO PROPRIETÁRIO DA COISA. Em seguida o venerando acórdão refuta essa objeção: A REGRA DO ART. 717 DO CÓDIGO CIVIL DETERMINA A INTRANSMISSIBILIDADE DO USUFRUTO, EXCETO EM FAVOR DO PROPRIETÁRIO, HIPÓTESE EM QUE OCORRE A EXTINÇÃO DO USUFRUTO PELA CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. A NORMA GENÉRICA DE IMPEDIMENTO DA TRANSMISSÃO do USUFRUTO, DECORRE DA NATUREZA DO INSTITUTO QUE É A DE NÃO SE PERPETUAR, VISTO CONSTITUIR DIREITO PERSONALÍSSIMO. ORA, NADA, PORÉM IMPEDE QUE O PROPRIETÁRIO ALIENE O DOMÍNIO E OS USUFRUTUÁRIOS O USUFRUTO É MESMA PESSOA, JÁ QUE SE CONSOLIDARÁ NESTE ADQUIRENTE A PROPRIEDADE DA COISA. Ao argumento de que no instante da lavratura da escritura pelo notário o adquirente do usufruto ainda não é o proprietário do imóvel, o que só ocorrer quando o registro da mesma for efetivado, foi o mesmo refutado pelo E. Conselho nestes termos: MAS, ENTENDER-SE A SITUAÇÃO JURÍDICA DESTA FORMA CONSISTIRIA FORMALISMO EXACERBADO, JÁ QUE DA ESCRITURA DECORRE A PRÁTICA DE DOIS ATOS DE REGISTRO; PRIMEIRAMENTE O REGISTRO DA COMPRA E APÓS, A AVERBAÇÃO DO CANCELAMENTO DO USUFRUTO, O QUE SIGNIFICA QUE O ÔNUS SERÁ CANCELADO EM RAZÃO DA CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. E conclui: NADA HÁ A IMPEDIR A VENDA CONJUNTA FEITA PELO PROPRIETÁRIO E USUFRUTUÁRIO (cf. Diário da Justiça, 29 de junho de 1984, pg. 19). O Doutor GILBERTO VALENTE DA SILVA, inegavelmente uma expressiva autoridade em Registro Imobiliário, não só pelo seu passado funcional ­ titular da 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo ­ como também pela sua permanente dedicação ao estudo desse ramo do direito, sob as letras G.V.S. assim aprecia •••